Tuesday 20 October 2009

How to save a life

"Step one you say we need to talk
He walks you say sit down it's just a talk
He smiles politely back at you
You stare politely right on through


Some sort of window to your right
As he goes left and you stay right
Between the lines of fear and blame
And you begin to wonder why you came


Where did I go wrong, I lost a friend
Somewhere along in the bitterness

I would have stayed up with you all night
Had I known how to save a life

Let him know that you know best
Cause after all you do know best
Try to slip past his defense
Without granting innocence


Lay down a list of what is wrong
The things you've told him all along
And pray to God he hears you
And pray to God he hears you...


Where did I go wrong, I lost a friend
Somewhere along in the bitterness
I would have stayed up with you all night
Had I known how to save a life


As he begins to raise his voice
You lower yours and grant him one last choice

Drive until you lose the road
Or break with the ones you've followed

He will do one of two things
He will admit to everything
Or he'll say he's just not the same
And you'll begin to wonder why you came


Where did I go wrong, I lost a friend
Somewhere along in the bitterness
I would have stayed up with you all night
Had I known how to save a life...
"

The Fray
Composição: Isaac Slade / Joe King

Thursday 15 October 2009

Eu, Você, Nós 2

Viver sob o mesmo teto, na saúde e na doença, exige muito mais que amor. No modelo contemporâneo de convívio, há cada vez mais espaço para a individualidade - o casal não precisa ser aquele grude o tempo inteiro. Ainda bem.

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"Começaram a namorar quando ela tinha 15 anos de idade, ele 17. Oito anos depois, ele se formou engenheiro agrônomo. Determinada, ela o encostou na parede para que a pedisse em casamento na frente de toda a família. "Achei que nunca mais o veria, mas no dia seguinte ele apareceu em cada todo arrumado", diz a advogada Marjorie Marla de Macedo, de Florianópolis, hoje com 30 anos. Foram morar juntos quase três anos depois, antes de festejar o matrimônio. "Foi um choque. Cada um levou 100% da personalidade para dentro de casa. Mas foi determinante para sabermos que só continuaríamos com esses 100% se respeitássemos o que o outro era, sentia, pensava". Embora tenham se casado à moda antiga, não continuam juntos por conveniência, como se fazia nos velhos tempos, e sim pelas afinidades. "Sempre nos divertidos muito juntos, mas às vezes vou à praia com os amigos e ele passa horas no sítio dos pais cultivando as plantas. Damos força para que cada um faça o que gosta sem a necessidade de estar sempre juntos", afirma Marjorie. "O ser humano busca inteireza no mundo que o cerca. Isso inclui a relação com parceiros amorosos, que hoje se casam atraídos pela singularidade do outro", diz a especialista em psicologia clínica Denise Gimenez Ramos, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

O amor continua sendo lindo, mas é cada vez mais raro abrir mão do que se gosta em nome dele. Os casais começam a descobrir que respeitar de verdade gostos pessoais, manias, idiossincrasias - a tal singularidade - é cada vez mais uma peça importante no mecanismo que faz o casamento realmente funcionar.

Um e um são três
Estamos em tempos de ênfase ao individualismo. IPod, festas e viagens de mochilão nos põem em contato com nosso jeito single de ser. Um casal não foge à regra: é a soma de olhares de dois seres únicos. No estudo Casamento contemporâneo: O difícil convívio da individualidade com a conjugalidade, da PUC-RJ, a especialista em terapia familiar e de casal terezinha Féres-Carneiro afirma que, na lógica do matrimônio, um e um são três. A relação é determinada por dois sujeitos, duas percepções de mundo e dois projetos de vida que convivem com uma relação amorosa, uma identidade conjugal e um projeto de vida do casamento. Para Terezinha, aí está todo o fascínio e toda a dificuldade de ser casal hoje em dia. Não por nada, os casórios rareiam e os divórcios crescem. "Um casamento no Brasil dura em média dez anos porque, em geral, as pessoas não se aprofundam uma na outra", diz a terapeuta de casais Cláudya Toledo. Ser solteiro vira uma opção de vida exatamenta pela sensação de liberdade, de ser dono do próprio nariz. Para um casal criar um modelo único de convívio, com espaço para cada personalidade expressar o que sente, é preciso tempo e energia. Afinal, sentir que você se encaixa com alguém que admira soa como uma ameaça à própria identidade, já que você vai compartilhar com a pessoa momentos de uma vida que era só sua. "Tem gente que não tem paciência porque realmente dá trabalho. Mas vale a pena pelo amadurecimento, a amizade, o suporte emocional, os momentos engraçados, a nova percepção do mundo. Vale a pena pela história que você vive", diz Marjorie.

De fato, o ser humano não nasceu para viver só. Por isso, as amizades. Com os amigos, acima de tudo, trocamos ideias. Segundo o psiquiatra Flávio Gokovate, em Uma história de amor... com final feliz, nossos camaradinhas nos garantem um aconchego intelectual. O amor é diferente. Diz respeito à necessidade de ter de volta o colo materno, uma referência que fica registrada em nosso subconsciente. Com o passar dos anos e a manifestação mais internsa da sexualidade, essa sensação volta a definir as relações de um adulto. "Mesmo quando mal conhecemos a essoa escolhida, passamos a nutrir por ela um sentimento parecido com o que tínhamos por nossa mão", escreve Gikovate. Conquistado, o amor não satisfaz completamente. É como quando éramos crianças: ficar no colo da mãe era gostoso, mas significava parar de brincar e de fazer também o que nos dava na telha.

Foi assim que se configuraram os casamentos durante um bom tempo, em que pombinhos pensavam se bastar juntos no ninho de amor... E viviam, não é surpresa, uma série de momentos enfadonhos! Quem é que consegue satisfazer todas as vontades ao lado da mesma pessoa o tempo inteiro? "Acontece que a vida prática mudou muito. E, com ela, as motivações. Os casais estão juntos, mais do que tudo, para curtir a vida, para o convívio prazeroso e os projetos de vida mais voltados a atividades lúdicas. As diferenças passam a ser importante fator de irritação, ao passo que as afinidades se tornam muito mais interessantes", escreve o psiquiatra. Essa memória conjunta de vivências dá sentido à vida.

Os amigos por perto
Muita gente diz que é preciso amar a si mesmo para então amar o outro. Talvez não seja bem por aí. Gikovate descreve o amor como algo interpessoal. "É o sentimento que temos por quem nos provoca sensação de paz e aconchego", afirma em seu livro. Antes de entrar de cabeça em uma relação, cada um deve ter em mente em que pé está sua autoestima - que, para o psiquiatra, equivale a um juízo de valor, e não a um sentimento. "É uma espécie de nota que damos a nós mesmos - em geral, nota equivocada para menos". Por isso, deposita-se tanto no outro a expectativa de curar os próprios traumas, medos e desânimo. Mas também se cometem erros do outro lado. Achar bonitinha a carência rotineira do parceiro pode ser um grande problema. "É comum falar que esse é um defeito charmoso do outro, até que o tédio se instala no casamento", afirma Thiago de Almeida, psicólogo especializado em dificuldades de relacionamento amoroso. para Cláudya Toledo, não há mais espaço no casamento para pessoas que não sejam autossuficientes. "Ninguém deixa ninguém triste ou alegre. Essa questão é individual. Se estou mal, não vou chegar aos farrapos em casa para que meu parceiro me conserte. Vou fazer ioga, caminhar na praça, qualquer coisa que me faça bem. Ou vou debilitar o casamento", diz.

O mesmo vale para quem se deixa dominar pelo outro, empurrando o relacionamento por água abaixo. "Já cheguei a um ponto em que ele me manipulava, mas assim que percebi contei com os amigos e a família para voltar a ser quem eu era. Hoje, ele brinca dizendo que um dia vai me domar, o que na verdade o atrai", diz Marjorie, convencida de que dar a volta por cima, reafirmando seu jeito de ser, fortaleceu ainda mais a relação. "O que o fez se apaixonar por mim foi minha personalidade única, sui generis. Não faria sentido perdê-la". Uma de suas prioridades hoje é sair com as amigas. "Temos conversas só nossas, inclusive combinamos várias vezes de passar fins de semana juntas na praia, sem os maridos", diz a advogada. Até mesmo durante uma viagem, quando a agente de viagens Gwen Budal Arins passou dois meses na cada da mãe com o marido, ambos arrumaram tempo para seus programas solos. "Logo que conheceu meus amigos, ele já arranjou um lugar para jogar futebol toda semana, e eu tinha as amigas que não via há tempos para colocar o papo em dia", afirma Gwen.

Segundo a psicóloga Denise Gimenez Ramos, estar com os amigos no mundo moderno é vital para o equilíbrio emocional. "O casal que se fecha entra em rota de colisão. Ter privacidade com os amigos para falar bobagem e comer pipoca é importante, até porque as amizades perduram muito mais que o casamento", diz ela. Ao mesmo tempo, o espaço conquistado pela mulher no casamento propõe o ideal de igualdade. "No passado, era normal a mulher seguir em tudo e com todas as forças as decisões do marido. Hoje, os homens reconhecem sua realização pessoa, seu êxito profissional, suas qualidades, que a distinguem dele", afirma o consultor Vital Didonet, de Brasília, que completou 25 anos de casamento em 2008. Isso inclui a liberdade individual, essencial a todos em uma relação.

Detalhes de nós dois
Na hora de juntar os trapos, ter ajuda para botar a casa em ordem também é crucial para o bom convívio e, sem dúvida, mexe com o jeito de ser de qualquer um. Marorie nunca se deu bem com os trabalhos domésticos. "De repente, casei e tive que cuidar de tudo", diz. Mesmo depois de anos de namoro, o casal entrou em conflito por causa disso quando se viu sob o mesmo teto. "Ele vivia na frente do computador por causa da carreira acadêmica e eu sempre dizia que ele não trabalhava e, ainda por cima, não me ajudava em casa. Foi marcante quando disse o quanto ficava magoado comigo por não respeitar sua profissão. Tive que retroceder", diz a advogada. Ao pôr as cartas na mesa, dividiram as tarefas como rpeparar a refeição e lavar a louça. Além disso, ela passou a deixá-lo em paz ao vê-lo no computador, pois sabe o quanto precisa se concentrar nas pesquisas. "Quando esclarecemos as diferenças, é onde fica a singularidade de cada um. É preciso ter feeling para saber quando vale a pena mudar de atitude", diz Marjorie. As fraquezas nunca vão deixar de aparecer. Afinal, somos humanos. Mas, quando um casal prioriza o respeito às singularidades, a dependência emocional dá lugar à amizade, ao erotismo e aos planos em comum, construídos pelo olher que cada um lança na relação. "Os dois se apoiam, ajudam-se, fortalecem-se, consolam-se, mas sempre olhando para o que está adiante deles", diz o consultor Didonet. Juntos, sim. Grudados, jamais."

Texto Débora Didonê
Fonte: Revista Vida Simples, Edição 84, Outubro de 2009

Tuesday 13 October 2009

Amor perfeito

Namoros e romances interrompidos provocam uma irritante pergunta anos depois: “Como seria a minha vida se tivéssemos ficado juntos?” Novos relacionamentos não apagam a lembrança interrogativa. A marca. O número do telefone na agenda. A ausência de uma última chance. A esperança de um encontro acidental.

O amor não se encerra, se abandona.

Quanto maior a chance de vingar o amor, mais se cria um jeito de interrompê-lo.

São detalhes bobos e tremendamente ridículos que costumam separar.

Um pouco de esforço, um pouco de paciência, e nada teria acontecido.

O orgulho é um péssimo confidente e não deixa voltar atrás.

O que é forte perturba, não acalma.

Não conversei até esse momento com nenhum apaixonado com a cabeça no lugar. Todos estão sem cabeça e uma boca imensa a murmurar sozinha.

Assim como os separados têm suas razões, e concordo com os dois lados.

Mas por que os separados têm tanta necessidade de explicar o fim do namoro ou do casamento? A gente só explica o que não conseguiu entender.

Minha culpa é explicativa; minha confiança é lacônica.

O amor que tinha tudo para ser ideal – e não foi – sofre do “passado do umbigo”.

O passado do umbigo é acreditar que a época mais feliz já aconteceu entre os dois e não há maneira de repeti-la. Concordo: não há como repeti-la.

Só que o passado do umbigo não permite que a felicidade cresça de outra forma, diferente da circunstância anterior.

A mínima mudança de repertório, e ambos ficam chateados. Se mudaram de emprego, mudaram de idéias, mudaram de rotina. Por que não podem mudar a forma de amar?

Termina-se prisioneiro do início da relação e não se busca favorecer a diferença, e sim insistir, em grau da chatice máxima, com a semelhança.

Outro sintoma que enfraquece o amor é a aparência diante dos colegas e conhecidos.

Quando o par escuta: “Vocês formam um casal perfeito”, cuidado!, esse elogio é perigoso. “O que queremos?” assume a condição deturpada de “o que eles vão pensar?”.

O casal passa a viver mais para fora do que para dentro de casa. A expectativa dos outros contamina a pureza do trato, do convívio, a solidão de raríssimas estrelas e terra escura.

Namorar assume o despropósito de desfilar.

Há tanta gente metendo o bedelho na história que o par não consegue escutar suas vozes e vontades.

Casal perfeito é o que se separou alguma vez para voltar mais sereno e apaixonado.

(Fabrício Carpinejar, em O Amor Esquece de Começar)

Saturday 10 October 2009

"Quando amamos, enxergamos o que pode ser."

Padre Fábio de Melo

Thursday 8 October 2009

"Do you know that the harder thing to do and the right thing to do...
...are usually the same thing?
Nothing that has meaning is easy.
Easy doesn't enter into grown-up life."

(Robert Spritzel, The Weather Man)

After doing the hardest thing I've ever done in my life.

Sunday 4 October 2009

As mágoas vão rolar

Como lidar com a ofensa e o perdão? Será que perdoar quem nos magoou é o caminho para a paz interior?

"A não ser que você seja um anjo imaculado e habite uma dimensão celestial, longe das imperfeições e das mazelas humanas, você já teve que perdoar alguém e também já precisou ser perdoado.

Eu diria que é improvável cruzar a vida sem prejudicar e ser prejudicado, magoar e ser magoado, decepcionar e ser decepcionado. Com ou sem intenção, nas relações humanas, esses verbos malquistos algum dia acabam sendo conjugados. E, nesses casos, o substantivo perdão tem de ser chamado a compor o texto, senão a vida não completa sua sintaxe.

O perdão é, sim, um importante meio de obter paz de espírito, ainda que não seja o único. Mas, como todos os outros recursos que pavimentam o caminho que leva ao estado de graça interior que, por sua vez, permite ao humano usufruir da tranquilidade de conviver consigo mesmo, o perdão verdadeiro é difícil de ser praticado.

Perdoar é o ato de libertar o outro da culpa, mas é mais que isso. Em sua função libertária, o perdão liberta quem o pratica. É um ato de grandeza de espírito, que representa, acima de tudo, uma doação.

For-give, vor-geben, per-dón, per-dão. Praticamente em todos os idiomas a palavra perdoar obedece a sua origem do latim vulgar perdonare, que é formada pela junção do prefixo per (através de ) com a palavra donare, que representa o ato de doar ou, melhor ainda, dar-se.

Através do perdão a pessoa doa o que há de melhor em si mesma - a compreensão, a compaixão e a esperança. Você me ofendeu e me magoou, e eu compreendo que você falhou porque é humano, compadeço-me por seu arrependimento e tenho a esperança de que tal não se repetirá. Por isso, o perdoo. Simples e belo. Mas... sempre possível? Essa é a verdadeira questão existencial do perdão.

Qual o melhor caminho para compreender o perdão?
"Errar é humano, perdoar é divino", dito o ditado. Mas ele está um pouco ultrapassado. Há tempos que o conceito de perdão abandonou o céu angelical para vagar em terra mundana. O principal motivo é que sem ele a vida em comunidade não seria possível, pois cada ofensa geraria uma inimizade. O perdão não é apenas uma atitude, é uma qualidade necessária à elevação dos espíritos, como demonstram várias áreas do pensamento humano que já se debruçaram sobre ele, como a filosofia, a psicologia e a religião.

Na Bíblia, o perdão é tema recorrente. No Velho Testamento, em Levítico (16:29-31), encontramos que Moisés institui um dia dedicado à purificação dos pecados. Considerado como um "estatuto perpétuo", tal data é respeitada pelos judeus, que a chamam de Yom Kippur - o dia do perdão. A importante ocasião ocoore logo após o Rosh Hashanah - o ano-novo judeu. Pedagógica correlação, pois esclarece que não se deve iniciar um novo ciclo sem perdoar e obter perdão.

Moisés havia subido o monte Sinai para ter um encontro com o Divino, de quem recebeu as tábuas com os Dez Mandamentos. Ao descer, a decepção. Encontrou os hebreus adorando uma imagem, uma estátua de bezerro, ignorando seus conselhos de que só devemos adorar a Deus. Em sua revolta, atirou as tábuas ao chão, quebrando-as, e não lhe restou saída senão voltar à montanha e pedir novamente as tábuas a Deus, implorando-lhe, também, o perdão. Ele então instituiu aquele dia para marcar o perdão concedido pelo Senhor à iniquidade de seu povo e a sua própria ira.

As orações e o jejum praticados no dia do perdão, além do compromisso de o ofensor não mais cometer as transgressões novamente, são alguns dos passos seguidos por aquele que quer limpar suas mágoas para começar purificado ano novo.

Foi nesse dia, em que a noção de perdão foi pela primeira vez esboçada como um importante valor humano, e também ali, dentro dessas mesmas raízes judaicas, que o cristianismo brotou.

O Pai-nosso, a oração mais importante entre os cristãos - que teria sido ensinada pelo próprio Cristo -, considera o perdão uma forma de estabelecer uma relação com Deus e com os homens. "Perdoai nossas ofensas assim como perdoamos a quem nos tenha ofendido", diz uma passagem, antes de pedir força para evitar as tentações e proteção contra os infortúnios da vida. Sim, o perdão precede o poder e a segurança.

Por que o perdão faz bem a quem perdoa e beneficia quem é perdoado?
Entre os filósofos, o perdão também é tema ancestral. Foi, só para ilustrar, assunto de simpósios, os encontros em que, entre um gole e outro de vinho, os antigos gregos se punham a discutir as grandes questões que inquietam o espírito humano, como a morte, a coragem e o amor. "Só quem tem a capacidade de perdoar conquista o direito de julgar", disse Sócrates num desses momentos de sabedoria e embriaguez em que a civilização ocidental foi gestada.

Contemporâneo de Cristo, o romano Sêneca introduziu o perdão na esfera do estado. Em sua obra, Tratado sobre a clemência, o tutor de Nero apresentou a arte de perdoar como a principal arma para o governante lidar com a justiça e firmar-se como estadista. Segundo o filósofo, praticar atos clementes seria exercitar a temperança do gênio, a tranquilidade do espírito e a virtude do erudito. O perdão real possibilitaria a coesão do estado na sociedade, atendendo às diferentes vontades das classes, ao mesmo tempo que serviria como excelente instrumento jurídico, permitindo a aplicação da pretensa justiça com moderação. Apesar disso, ele mesmo foi vítima da falta de perdão. Desconfiado de sua traição, Nero o condenou à morte.

Depois de muitos séculos e de muitas reflexões e textos sobre o assunto, a filósofa alemã Hannah Arendt, que migrou para os Estados Unidos com a ascensão do nazismo, escreveu em seu livro A condição humana, que o perdão é uma resposta libertária: "o perdão é a única forma de reação que não 're-age' apenas, mas age de novo e inesperadamente, sem ser condicionada pelo ato que provocou e de cujas consequências liberta tanto quem perdoa quanto o que é perdoado (...) é a liberação dos grilhões da vingança".

Com essas palavras, ela faz uma conexão com a psicologia, que busca a qualidade do pensamento e a calma das emoções, e diz que perdoar faz bem porque livra a pessoa das amarras do ódio e da injustiça. Perdoar beneficia quem é perdoado, mas favorece principalmente quem perdoa. Acontece que perdoar é uma atitude, mas primeiro é um sentimento. Antes de perdoar com as palavras, é necessário perdoar com a mente e com o coração, senão o efeito não é o mesmo, fica pela metade, vira falsidade. É preciso coragem para perdoar de verdade.

É de autoria de Freud o notável texto "Repetição, lembrança, translaboração". Nele, o pai da psicanálise propõe que o inconsciente, que aprisiona a pessoa no passado e não permite que ela conviva em harmonia com o presente nem consiga ver esperança no futuro, seja examinado com coragem e grandeza suficiente para produzir o mais importante dos perdões: o perdão a si mesmo.

E quando a pessoa não merece perdão?
A verdadeira questão filosófica do perdão é a opção de aplicá-lo. Mais importante que perdoar é decidir perdoar com convicção, o que implica visitar os princípios da justiça.

No casamento de sua filha, meu amigo José Ernesto protagonizou um dos mais comoventes momentos que eu já tive a oportunidade de presenciar. Ao dizer aos noivos o que ele lhes desejava, aconselhou: "Sempre que possível, escolham o perdão. Sempre que necessário, escolham a justiça".

Em duas frases, ele sintetizou a essência das relações humanas que valem a pena. As relações devem ser dotadas de valores, não apenas de objetivos comuns. Quando as pessoas se juntam apenas por motivos utilitários, remetem sua relação à época dura das cavernas, em que tudo era permitido em nome da sobrevivência. Casamentos, amizades, empresas, agremiações políticas - qualquer tipo de encontro entre duas pessoas tem um objetivo que as mantenha unidas, mas se for apenas isso a uni-las - objetivos, metas, destinos -, pessoas não serão pessoas, mas meros componentes de uma engrenagem mecânica. Ao humano, competências conferem utilidade, valores providenciam dignidade.

Não há vida digna sem justiça, e o perdão é parte dela. Parte. Perdão não é justiça. Perdão é decorrente da justiça. E praticar justiça remete a pessoa à tarefa de julgar, provavelmente a mais ingrata das missões humanas, pois significa entender os motivos de quem fez o que fez, considerar os efeitos do que foi feito e decidir sobre a pena justa e conveniente, que pode ser, entre outras, o perdão.

É possível perdoar o assassino frio, o estuprador impiedoso, o corrupto contumaz? É justo perdoar o juiz da Inquisição, o patrocinador do Holocausto, o instaurador do Apartheid? Ora, sem considerar a justiça, o perdão é obsceno; sem contemplar o perdão, a justiça é malévola; afinal, a justiça é uma necessidade, o perdão, uma possibilidade.

Ainda assim, mesmo considerando que seja pesado julgar, difícil ponderar os fatos envolvidos, doloroso relevar mágoas, impossível esquecer ofensas, o ato de perdoar é grande, digno e belo. Até porque, ao julgar alguém, é conveniente fazer algum julgamento de si mesmo, para, ao perdoar o outro, guardar para uso próprio um pouco do perdão. Porque você, eu, qualquer um, se viveu uma vida, precisará ser perdoado por não tê-la aproveitado melhor."

Texto: Eugenio Massuk
Fonte: Revista Vida Simples, Outubro 2009, Edição 84

Saturday 3 October 2009

“Cada boa ação que você pratica, é uma luz que você acende em torno de seus próprios passos”.

Chico Xavier