Monday, 3 August 2009

O ciclo da auto-sabotagem (2a parte)

Livro de Stanley Rosner e Patricia Hermes

"A escolha do parceiro do casamento é, muitas vezes, a representação da relação mal resolvida com um dos pais, aquele que não conseguiu atender às necessidades do filho. A escolha inconsciente do parceiro representa uma tentativa de "mudar aquele pai/mãe", de conseguir o amor e o carinho que faltou. O resultado se apresenta na forma de queixas do tipo: "não foi isso que eu disse", "ele não me defende". Isto, por sua vez, gera lutas pelo poder, batalhas de vontades, brigas sobre quem está certo e quem está errado. Geralmente, o que vem a seguir é aquela sensação silenciosa, mas bastante incômoda, de estar pisando em ovos, para não desequilibrar a balança.

Às vezes, há uma vaga consciência do que está acontecendo, pensamentos confusos de que o cônjuge está se comportando como o pai/mãe frustrador, mas tais pensamentos são geralmente repelidos. Porque fracassamos no reconhecimento da dinâmica da interação com o cônjuge e porque não queremos nos lembrar inteiramente do impacto prejudicial que aquele pai/mãe teve sobre nós, tendemos a repetir muitas vezes a relação. Temos a expectativa de que, da próxima vez, seremos bem-sucedidos naquilo que queremos. Vivemos com a esperança de que encontraremos, no casamento, a satisfação que não encontramos até agora.

Um outro problema é como os indivíduos reagem ao trauma. A interrupção na comunicação, apresentada de modo tão comum como a causa dos problemas nos relacionamentos, é, na realidade, parte da estrutura de defesa em resposta ao trauma. Não é apenas a interrupção na comunicação verbal, mas na comunicação emocional também. Há um entorpecimento dos sentimentos e da sensibilidade. "Se você não estende a mão para mim, por que eu devo estender a minha para você?" O resultado é que a relação baseia-se em tentativas, na qual cada indivíduo sente necessidade de pisar leve, para evitar qualquer situação incômoda ou real. Com medo de represália, medo da própria raiva, a tendência é isolar-se, calar-se tanto verbalmente quanto emocionalmente.
"Ela não fala comigo" é uma queixa comumente ouvida. Esse estado de alienação é baseado no medo de que o cônjuge se irrite se o outro expuser seus sentimentos. Esse medo também é expresso em termos de fragilidade: "não posso dizer nada, porque ela vai desmoronar, ela é tão sensível". Então o distanciamento continua e fica cada vez maior.
Não expressar sentimentos e reações em palavras, por sua vez, leva a pessoa a não expressão sentimentos em comportamentos e em reações emocionais. "Por que eu deveria dizer como me sinto? Ele não vai me ouvir. Não vai fazer a menor diferença".

Se um dos parceiros arriscar seus medos e reconhecer que a frieza é em razão da evitação da agressão ou da possibilidade de se magoar, então a barreira do silêncio pode começar a ser rompida. É necessário reconhecer que o medo da raiva e o medo da fragilidade são aprendizados trazidos de relacionamentos traumáticos anteriores. "Ela não é minha mãe, que não me defendia quando eu precisava". "Ele não é meu pai, que me fuzilava com os olhos se eu expressasse minha raiva".
Ao alcançar esse reconhecimento, é possível mudar relacionamentos atuais.

A compulsão à repetição é uma forma de traduzir em ação um trauma por meio de um comportamento destrutivo, embora quase sempre o indivíduo não tenha noção de que é exatamente isso que está fazendo.

Há uma grande diferença entre estar em situações difíceis que ocorrem sem que a pessoa tenha consciência do que está acontecendo e o reconhecimento de que há alternativas e que é possível efetivar mudanças em comportamentos de auto-sabotagem. A diferença, a diferença vital, é o reconhecimento. Freud escreveu: "Na verdade, eu sempre soube disso; só que isso não me passava pela cabeça".

1 comment:

Cigerza said...

Muito bom isso!
Vou ler esse livro ;)