“Lembrem-se de Proust em Em busca do tempo perdido: ‘Albertine presente, Albertine desaparecida...’ Quando ela não está presente, ele sofre atrozmente: está disposto a tudo para que ela volte. Quando ela está presente, ele se entedia: está disposto a tudo para que ela vá embora. Não há nada mais fácil do que amar quem não temos, quem nos falta: isso se chama estar apaixonado, e está ao alcance de qualquer um. Mas amar quem temos, aquele ou aquela com quem convivemos, é outra coisa! Quem não viveu essas oscilações, essas intermitências do coração? Ora amamos quem não temos, e sofremos com essa falta: é o que se chama de um tormento amoroso; ora temos quem já não nos falta e nos entediamos: é o que chamamos um casal. E é raro que isso baste a felicidade.
É o que Schopenhauer, como discípulo genial de Platão, resumirá bem mais tarde, no século XIX, numa frase que costumo dizer que é a mais triste da história da filosofia. Quando desejo o que não tenho, é a falta, a frustração, o que Schopenhauer chama de sofrimento. E quando o desejo é satisfeito? Já não é sofrimento, uma vez que já não há falta. Não é felicidade, uma vez que já não há desejo. É o que Schopenhauer chama de tédio, que é a ausência da felicidade no lugar mesmo da sua presença esperada. Você pensava: ‘Como eu seria feliz se...’ E ora o se não se realiza, e você é infeliz; ora ele se realiza, e você nem por isso é feliz: você se entedia ou deseja outra coisa. Donde a frase que eu anunciava e que resume tão tristemente o essencial: 'A vida oscila pois, como um pêndulo, da direita para a esquerda, do sofrimento ao tédio'. Sofrimento porque eu desejo o que não tenho e porque sofro com essa falta; tédio porque tenho o que, por conseguinte, já não desejo.”
André Comte-Sponville, em A Felicidade, Desesperadamente
Sou uma leitora assídua do fotolog de Carol Cigerza. Fui apresentada a esse livro do André Comte-Sponville através dessas leituras. E esse trecho do livro, que ela publicou no fotolog, é muito apropriado e atual para ser ignorado. Então resolvi postar aqui também.
Eu estou construindo aos poucos a minha teoria de que o problema é que nós colocamos a felicidade fora de nós mesmos, nas coisas e em outras pessoas. Por isso a vida oscila entre sofrimento (na falta de algo externo) e tédio (em não querer mais aquilo que já se tem).
Acho que nós confundimos felicidade com a adrenalina da conquista. Infelizmente, isso parece verdadeiro para todos nós. Mas, sem estar casado e feliz consigo mesmo, a vida vai seguir sendo uma monogamia (ou poligamia) consecutiva, onde sempre se precisa de mais e mais.
É, vamos continuar filosofando pra ver se a gente encontra uma saída.
Tuesday, 30 September 2008
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1 comment:
Às vezes, acho que não responsabilizamos outras pessoas pela nossa felicidade - mas, sim, pela nossa infelicidade.
Concordo com o autor, no sentido de que há uma banalização da palavra felicidade (http://www.fotolog.com/cigerza/49719069), e não compreendemos que é impossível estar "radiante" em tempo integral.
É então que, na falta da "felicidade" por um momento em nossas vidas, associamos atos e atores ao momento de inquietude, nos julgamos infelizes e buscamos alterar o quadro.
Sim, sim... Vamos continuar filosofando! Filosofar é sempre válido, e faz bem pra alma.
;)
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